terça-feira, 29 de março de 2011


- E você não se arrepende de nada?
- Eu bebi demais, usei drogas demais, arranjei brigas demais. Me arrependo de todo o resto.

segunda-feira, 28 de março de 2011


Prensei dois dedos na porta, gangrena não é algo tão instantâneo assim. E você sabe da minha inabilidade com a mão esquerda, eu erraria os números do teu telefone que eu decorei por pura incapacidade de usar uma agenda. Eu sinto falta daquele aparelho antigo, com o disco, a gente se irritava um pouco com o excesso de zeros nos números de assistências técnicas. Eles diziam horário comercial e prendiam a gente em casa, olhando praquela máquina ociosa no canto da área de serviço. Você fumava e jogava bitucas no vão do elevador, só pra ninguém ver. A dor tem as cores de Munch, já notou?

sexta-feira, 25 de março de 2011

Vontade de pensar que a sexta-feira
traz um certo ineditismo
palavras novas que não constam em dicionários online
alguns atos não institucionais

segunda-feira, 21 de março de 2011


Ele se levantou e falou de Mishima.
Alguém pensou que harakiri era nome de um drink e nunca entendeu porque se colocam guarda-chuvinhas de crepom em harakiris.
A noite estava nublada demais e a maior lua cheia de todos os tempos passou despercebida.

domingo, 20 de março de 2011

"Sou, por temperamento, um vagabundo. Não quero dinheiro tanto a ponto de ter de trabalhar por ele. Na minha opinião, é uma pena haver tanto trabalho no mundo. Uma das coisas mais tristes que existem é que a única coisa que um homem pode fazer durante oito horas por dia, todos os dias, é trabalhar. Você não pode comer oito horas por dia, nem beber oito horas por dia, nem fazer amor por oito horas — você só pode trabalhar por oito horas. E é por essa razão que o homem faz a si mesmo e a todos os outros tão miseráveis e infelizes.”

Faulkner (via Bruno)

terça-feira, 15 de março de 2011


Me apaixonei loucamente - de novo - e comprei quatro pneus novos
Li um parágrafo inteiro do Saramago, que eu continuo detestando
Me esqueci completamente do estepe
E de anestesias a base de lidocaína
Tudo parece estar funcionando

segunda-feira, 14 de março de 2011

Faca não é a mais letal das armas, não é algo com o qual você possa ferir de verdade meu ventrículo esquerdo.

sábado, 12 de março de 2011

Aquela fome que bate às quatro da manhã enquanto a operadora de TV a cabo libera alguns canais. A piada do seriado de quatro anos atrás ainda funciona. Eu queria te contar mas não me lembro. Eles chamam isso de degustação e têm a certeza de que no dia seguinte a gente vai comprar o pacote. Eles deveriam saber que às vezes tudo que a gente quer é que não amanheça.

terça-feira, 8 de março de 2011

E em breve, nas lápides, leremos coisas assim: viveu por 5.321.890 caracteres.

quarta-feira, 2 de março de 2011


é se matar com um tiro no pé porque a morte tem que ser lenta
é acreditar que meditação zen funciona e que a paz está logo ali no hemisfério esquerdo do seu cérebro
é se gabar por ter passado incólume pela câmera de segurança da loja escrota do shopping center onde trabalha a vendedora que não sabe que se trepa de quatro
é comprar um 4X4 zero km para assistir na televisão da sala os afogamentos causados pela enchente
é cuspir o tabaco do charuto úmido dentro do aquário e tapar a cárie com fumaça
é vomitar numa latrina química porque alguém te encheu a cara de declarações instantâneas dizendo que o amor era pra valer
é enfiar um tubo na sua traquéia porque ela está toda arranhada por pílulas quadradas de felicidade que não se dissolvem em água
é colecionar filmes do Abbas Kiarostami e pensar que isso realmente impressiona a filha da sua madrasta que é alérgica ao látex de camisinhas
é sentar com deus na mesa suja do canto do boteco e trocar uma última palavra antes das duas pedras de gelo